quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Vamos ao médico? (I)

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

O cérebro precisa de ginástica (II)



Composição de dicionários e romances franceses do Séc. XIX
   Continuação do texto anterior......

As pessoas idosas citam com frequência que se distraem com mais facilidade, têm mais dificuldade em manter o foco em uma atividade, sentem-se com dificuldade em manter a atenção por muito tempo, perdem objetos com mais frequência e têm esquecimentos continuamente. Também estão mais lentas em suas respostas aos estímulos, em assimilar e manipular informações, em aprender novas línguas e outras habilidades, resolver problemas ou interpretar detalhes. Some-se a essas dificuldades o fato dos órgãos dos sentidos também estarem mais lentos e menos sensíveis diminuindo a força dos estímulos.
Precisamos oferecer ao nosso cérebro oportunidades para aumentar sua plasticidade com acréscimos de neurônios e de novas sinapses ou conexões perfazendo novos caminhos. O nosso “comando geral” precisa exercitar suas habilidades por meio de mudanças e desafios, precisa mexer-se, fazer “ginástica”.  O que não é usado tende a degenerar.
A “ginástica” cerebral já está muito divulgada e são inúmeras as experiências com animais e seres humanos que utilizam vários métodos e recursos. O foco principal de qualquer programa de recuperação ou prevenção de problemas deve ser sempre projetado por meio de tarefas ou atividades novas ou modificadas, para o desenvolvimento específico de determinadas habilidades, porque a neuro plasticidade é sempre dependente de aprendizado e treinamento constantes. Esses programas exigem uma dose grande de disciplina, força de vontade e automotivação. A recompensa é o cérebro envelhecer mais lentamente e manter por mais tempo a qualidade de vida.
Ainda não há muitos dados consistentes sobre quais os tipos de atividades que realmente dão uma vida saudável ao cérebro humano.
Sabe-se que a aprendizagem é fundamental e a partir desse conhecimento os estudiosos indicam a aprendizagem de, por exemplo, línguas estrangeiras, um novo instrumento musical, iniciar novos cursos,  percorrer novos caminhos, manter-se atualizado nas novas tecnologias, viajar para novos destinos, conhecer novas pessoas, participar de novos grupos de amigos, criar oportunidades para novos trabalhos, realizar novas tarefas, criar novos interesses e “hobbies” ou passatempos.
Também parece dar resultado a solução de problemas exigindo do cérebro a captação, assimilação e manipulação de novas informações. Os especialistas indicam para manter a saúde cerebral, atividades como: a discussão de novas ideias, a solução de problemas e desafios, a criação artística e a experimentação de estímulos diferentes. A leitura de livros que exijam atenção e memorização é uma das atividades mais recomendadas.
Na década de 1990 surgiram as “universidades da terceira idade”, em várias países, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida e o desenvolvimento integral de idosos por meio de um programa de atividades baseado em educação, saúde, esporte, lazer, arte e cultura. Essa iniciativa vem contribuindo significativamente e pode atuar como preditores de uma velhice bem-sucedida. No Brasil já existem várias cidades que contam com esse estilo de instituições, em geral, gratuitas.
Um terceiro conjunto de tarefas importantes para a saúde mental é manter o controle de sua própria vida, tomando as principais decisões em todos os setores do cotidiano, ou seja, não abdicar de ter sua opinião própria e escolher como quer viver. Manter uma atividade ocupacional, manter-se “antenado”, atento ao ambiente e à vida moderna, controlar suas finanças e obrigações fiscais, rodear-se do que gosta e fazer aquilo que lhe dá prazer, ou seja, ser senhor de si mesmo.
Mas, cuidado!!!! Se a inatividade é desastrosa para o nosso cérebro, a atividade em excesso e sem o repouso adequado, também pode prejudicar a saúde cerebral. Da mesma forma que precisamos controlar o equilíbrio entre a atividade e o repouso físico, a saúde mental  depende de uma manutenção cuidadosa e equilibrada.  As mudanças repentinas ou sem o acordo do idoso também podem lhe tirar anos de vida saudável.
Aprender significa, na prática, mudar, mexer o cérebro, flexibilizar os neurônios. E aqui estou eu a criar um blog ou site!!!!!!

sábado, 16 de novembro de 2019

O cérebro precisa de ginástica (I)


      
Bordado com fios de seda sobre linho, em 1852, por uma artesã portuguesa

Desde muito nova conscientizei-me que o comando geral do meu corpo estava situado dentro da caixa óssea da minha cabeça: o cérebro. A própria natureza tratou o cérebro como um órgão nobre e muito delicado oferecendo-lhe uma proteção óssea, tipo capacete, para protegê-lo. Também lhe ofereceu uma cobertura densa de cabelos para protegê-lo e aumentar a sua sensibilidade. Não é necessário tocar a pele da cabeça para saber que alguma coisa se aproximou; é só tocar num fio de cabelo.
            Com sua delicada estrutura, órgãos e seus neurônios, o cérebro humano comanda o sistema mais complexo do planeta e integra todo esse conjunto por meio de processos e mecanismos extremamente sofisticados. Ele comanda e controla, não só as atividades físicas (voluntárias e involuntárias) como, também, as mentais (memória, aprendizagem, cognição, raciocínio, reflexão e outras).
            Até à década de 60, os cientistas achavam que o cérebro era uma estrutura estática, inflexível, determinada pela genética, incapaz de se alterar ao longo da vida adulta.
            Nas décadas de 70 e 80 as pesquisas científicas vieram demonstrar que o cérebro foi construído para mudar em função das atividades e experiências vividas. Ele muda física e quimicamente, a partir da forma como é usado. Novas habilidades ou comportamentos exigem adequações nas conexões neurais que são realizadas por meio de novos neurônios e novas sinapses criando novos “percursos”. Além disso, várias substâncias químicas são produzidas em função das atividades e experiências exigidas do cérebro que, por sua vez produzem novas reações e sensações. 
Portanto, essas mudanças e adequações provocam alterações na plasticidade e funcionalidade do cérebro. É o que, aqui, estamos chamando de “ginástica”, ou atividade mental voluntária realizada para desenvolver essas reações. Ao se executar uma ação mental melhora-se essa capacidade e a própria estrutura do cérebro. É este efeito que explica o fato de aperfeiçoarmos uma habilidade exercendo-a constantemente, praticando exercícios com frequência. Nos bancos escolares exigem-nos a resolução de problemas, a prática de exercícios linguísticos, as leituras e estabelecimento de relações e outras atividades próprias da vida escolar para aprendermos, desenvolvermos potenciais e executar tarefas com maior competência.
As mudanças ocorridas pela constância na execução de uma atividade podem reduzir ou melhorar a habilidade ou capacidade. Sempre que uma atividade, um comportamento ou uma atitude é repetido muitas vezes e se torna automático, o cérebro fixa o “percurso” neural que o suporta e vai exigir muito mais esforço para mudar, enrijece-se.  Diz-se, popularmente que o velho é teimoso, tem pouca flexibilidade, não muda, torna-se empedernido. Possivelmente, seu cérebro está a caminho da “cristalização”; gosta de comer sempre o mesmo, sentar-se na sua poltrona muito usada, sair de casa para ir aos mesmos lugares, ouvir as mesmas músicas, repetir os mesmos caminhos, assistir aos mesmos programas e conversar com as mesmas pessoas sobre os assuntos de sempre. Esta repetição constante de ações e comportamentos impede o cérebro de flexibilizar-se, diminui a plasticidade cerebral. Falta-lhe “ginástica”.
Esses achados das pesquisas foram imprescindíveis para aperfeiçoar a maneira como se mantém a saúde mental e como se deve atuar na recuperação de lesões mentais. Seu estudo ainda está longe de estar completo, mas já se pode aplicar e obter benefícios para os seres humanos.
Paralelamente, o conhecimento sobre a evolução do indivíduo mostrou que o uso intenso do cérebro, vinte e quatro horas por dia, durante muitos anos, vai desgastando sua vitalidade e harmonia. A rapidez dessa deterioração depende, além das determinações genéticas, dos eventos acidentais de que é vítima, das lesões sofridas, de como suas células são cuidadas durante a vida, dos nutrientes que recebe, dos desafios físicos e mentais que lhe são impostos e das capacidades que lhe são exigidas.
                                                                                          Continua na próxima postagem....









sexta-feira, 8 de novembro de 2019

A CONVIVÊNCIA COM PESSOAS É ESSENCIAL



CASAL - Escultura em bronze do artista brasileiro Vasco Prado (1914-1998)
ENTREVISTA 
com Amantino Ramos de Freitas, brasileiro, 79 anos, engenheiro civil, com mestrado e doutorado nos Estados Unidos.  Atuou durante vinte anos como diretor da divisão de Madeiras do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT).  Fundador e atual vice-presidente da CPTI Tecnologia e Desenvolvimento, empresa cooperativa de ex-funcionários do IPT; presidente da Sociedade Brasileira de Silvicultura (SBS).

MRF – Você escreveu um texto muito interessante sobre a importância dos bons relacionamentos na saúde, bem-estar e longevidade dos seres humanos. Por que esse assunto lhe chamou a atenção?
AR de F – Tenho observado com frequência que muitos indivíduos que progridem na vida e alcançam algum prestígio e boas condições sociais e econômicas, tendem a pensar que tudo o que lhes acontece é resultado de sua inteligência e esforço e passam a acreditar que são melhores que os demais e que esse sucesso lhes garante mais privilégios e direitos.  Essa “superioridade” não lhes proporciona uma verdadeira felicidade; pelo contrário, ficam frustrados com facilidade e podem se aborrecer profundamente com questões irrelevantes.  Por outro lado, as pessoas que não se julgam tão importantes e que valorizam as pequenas alegrias cotidianas e os seus relacionamentos familiares, sociais e afetivos, parecem desfrutar de uma relativa felicidade.  Essas observações motivaram-me a ler e a refletir sobre os fatores que influenciam e determinam a conquista da felicidade e da saúde nos seres humanos.
MRF – Você, no seu texto, citou um estudo muito importante realizado pela Universidade de Harvard sobre o que proporciona uma vida feliz, saudável e longa aos seres humanos. Pode nos contar alguma coisa sobre ele?
AR de F – Posso, sim.  Trata-se de um estudo muito longo que foi iniciado em 1938, denominado “Estudo sobre o desenvolvimento de adultos” na Universidade de Harvard e que perdura até aos dias atuais.  Esse estudo foi realizado com 724 adolescentes provenientes de duas camadas sociais diferentes: um grupo foi constituído por alunos da própria universidade filhos de famílias mais abastadas e o outro foi composto por adolescentes carentes residentes em bairros pobres de Boston.  Essa população foi acompanhada por meio de questionários que incluíram questões sobre seus casamentos, satisfação no trabalho e atividades sociais.  A saúde foi acompanhada por meio de exames a cada cinco anos.
Cerca de 60 homens que participaram do estudo ainda estão vivos, a maioria com mais de 90 anos.  Os pesquisadores agora pretendem estudar a segunda geração, mais de 2.000 descendentes dos participantes do estudo original.  A ideia é identificar como as experiências da infância influenciam a saúde na meia-idade.
MRF – E quais as principais conclusões a que chegou a equipe de pesquisadores?
AR de F - Numa conferência, em novembro de 2015, o professor de medicina psiquiátrica dessa universidade e atual coordenador desse estudo, Robert Waldinger, afirmou que não é a fama nem o dinheiro que determina a nossa sensação de felicidade, a nossa saúde e o nosso tempo de vida e citou um estudo que mostrou que a meta principal de 80% dos jovens da atual geração é o “ficar rico”.  Afirma que o estudo de Harvard mostrou que existem três fatores determinantes da felicidade, saúde e longevidade.  O primeiro são as relações sociais porque “a solidão mata”.  As pessoas que têm mais ligações sociais e de amizade são mais felizes, são mais saudáveis e vivem mais tempo do que aquelas que se isolam.  A experiência da solidão acaba por ser tóxica.  Em outras palavras, os indivíduos com mais dificuldade de estabelecer interações sociais e de amizade são menos felizes, tem a saúde deteriorada mais depressa, sua memória e funcionamento cerebral diminuem mais cedo e vivem menos tempo.
O segundo fator é a qualidade das relações próximas; viver no meio de conflitos é prejudicial à saúde, enquanto conviver amistosamente protege a saúde.  A qualidade dos relacionamentos é mais importante que a quantidade.
Por último, o estudo provou que os seres humanos têm necessidade de conviver de forma próxima com pessoas com as quais podem contar em momentos de necessidade, sentem-se mais protegidas e seguras.  Mesmo nos casos em que essas relações de proximidade tenham momentos difíceis, o fato de sentirem segurança no outro auxilia no bem-estar dos indivíduos.  A conferência do Dr. Waldinger está disponível na Internet no site: https://www.ted.com/talks/robert_waldinger_what_makes_a_good_life_lessons_from_the_longest_study_on_happiness?language=pt.

MRF – Na sua opinião, como esses fatores podem ser colocados em prática?
AR de F – As possibilidades para se construírem boas relações são ilimitadas.  Há soluções muito simples, como por exemplo, substituir o tempo gasto em frente à televisão por contatos com amigos e parentes, ou resgatar relações que esmaeceram e que podem ser recompostas. Nas horas de folga podem-se criar oportunidades de tarefas em grupo, buscar participação em trabalhos voluntários, prestar serviços a comunidades carentes, e outras iniciativas similares.  Guardar rancores eternos, afastar-se de pessoas por motivos banais, manter e estimular rusgas são comportamentos que podem ter efeitos negativos para a própria saúde e bem-estar.  Há mais de 100 anos, Mark Twain (1835-1910), escritor e humorista norte americano, já dizia “A vida é curta – não há tempo para discussões, desculpas, amarguras ou prestação de contas. Só há tempo para amar e, mesmo para isso, é só um instante”.  Parafraseando um grande amigo e renomado enólogo: “a vida é curta para se tomar vinhos de má qualidade” ...